No começo deste mês, quando os cristãos (católicos principalmente) celebram sua maior festa, o Cardeal arcebispo de São Paulo dom Odilo Scherer publicou um texto reproduzido em jornais condenando o culto excessivo a figura do Papai Noel ofuscando a celebração do nascimento do menino Jesus.
O site Guarulhos Web publicou em 22/12/2011 uma entrevista: Dom Odilo Scherer: "Papai Noel vai conseguindo o que Herodes não conseguiu". Nela a autoridade religiosa afirma que o Natal se tornou uma grande ocasião para o consumismo e a referência a Jesus Cristo nem aparece mais.
Em 13/12/2011 o blog CEBs Notícias publicou a íntegra do texto de Dom Odilo Scherer, copiado abaixo:
Conseguirá Papai Noel, o que Herodes não conseguiu? - "Matar o menino?!"
O Menino, o rei e o bom velhinho
No Natal os cristãos comemoram o nascimento de Jesus Cristo. Aconteceu há cerca de 2 mil anos, quando ainda não se fazia registro do nascimento com lugar, dia e hora – isso é bastante recente. Mas quem duvidaria de que Jesus nasceu e existiu? Vinte séculos de testemunhos ininterruptos mantiveram viva sua memória, apesar das tentativas de apagar sua lembrança da História. Perseguições aos seus seguidores, regimes totalitários ou simplesmente movimentos culturais já se propuseram a eliminar, depurar ou passar para a posteridade de maneira distorcida o legado de Jesus Cristo para a humanidade. Não conseguiram.
Isso já começou logo que Jesus nasceu. Conta-nos o evangelista São Mateus que o rei Herodes, encarregado romano de governar a Judeia, ao saber que em Belém havia nascido um menino, procurado e admirado por gente de toda parte, ficou assustado e quis saber mais sobre o pequeno: era Jesus, filho de Maria, casada com José, o carpinteiro de Nazaré. Sábios e intérpretes das Escrituras Sagradas afirmavam ao rei que as profecias sobre o ressurgimento do reino de Davi apontavam para Belém e o futuro rei poderia ser esse mesmo, o pequeno que acabara de nascer. Herodes, enciumado e furioso, tentou eliminá-lo já no berço, mas não conseguiu: o bom José tomou o menino e sua mãe e fugiu com eles para o Egito. Enquanto isso, Herodes espalhava terror e luto em Belém e arredores, com a ordem para que todos os meninos abaixo de 2 anos de idade fossem mortos (cf. Mt 2).
Nos primeiros tempos do cristianismo, os cristãos comemoraram mais a Páscoa do que o Natal. O anúncio do Evangelho estava centrado, sobretudo, no significado dos padecimentos, da morte e ressurreição de Jesus, no início da pregação dos apóstolos e no surgimento prodigioso da Igreja. Aos poucos, porém, também foi incluída a reflexão sobre a origem de Jesus, seu nascimento e sua infância, que a Igreja comemora no Natal (cf. Mt 1-2 e Lc 1-2).
Teólogos e pregadores dos séculos seguintes elaboraram reflexões de extraordinária beleza e profundidade sobre essa primeira etapa da vida de Jesus, partindo da fé dos cristãos: nesse menino, o próprio Deus veio ao encontro da humanidade e assumiu nossa condição frágil e precária, para redimi-la e dar-lhe sentido e perspectiva de futuro. A liturgia católica do Natal ainda conserva algumas dessas joias, que o pensamento teológico lapidou naquela época: “Ó Deus, nesta noite santa, o céu e a Terra trocam seus dons… No momento em que vosso Filho assume a nossa fraqueza, a natureza humana recebe uma incomparável dignidade!”.
São Nicolau, um bispo do 4.º século nascido em Mira, na atual Turquia e cujo sarcófago está conservado na Catedral de Bari, no sul da Itália, compreendeu isso muito bem: na festa do Natal, saía pelas ruas distribuindo presentes aos pobres, sobretudo às crianças. Queria, assim, compartilhar a festa e a alegria com todos porque o Natal de Jesus era um imenso presente de Deus para a humanidade inteira! Talvez tenha nascido aí a tradição dos presentes de Natal e da festa contagiante, que também hoje se faz.
Na Idade Média, São Francisco de Assis não se cansava de contemplar o “sublime mistério” do Natal: o Grande Deus veio a nós na simplicidade e na fragilidade de uma criança! Alguém poderia ter imaginado algo assim?! Ninguém mais precisa ter medo de se aproximar do Eterno! Os braços estendidos do menino são o abraço de Deus, que acolhe a todos com infinita ternura!
Francisco, poeta e cantor da beleza, quis que a cena do Natal de Jesus, narrada nos Evangelhos, fosse percebida concretamente e “criou” o presépio, com a ambientação e os figurantes dos relatos bíblicos sobre o nascimento de Jesus. A tradição dos presépios no Natal espalhou-se rapidamente pelo mundo cristão.
Os tempos modernos deram-se conta de que o Natal tinha um apelo comercial muito bom e vendia bem. Natal virou coisa para comprar! E para promover melhor o seu consumo foi criado um garoto-propaganda, chamado Papai Noel, o “bom velhinho”, de barbas brancas, botas, roupão vermelho e gorro de lã… Alguma coisa nele ainda lembra o bispo São Nicolau, de outros tempos, que distribuía presentes de verdade! Papai Noel saiu da fantasia, talvez de trenó puxado por renas imaginárias, lá dos espaços nórdicos, onde faz frio nesta época do ano. Mas se deu muito bem nos trópicos também… Que importa um pouco de suor debaixo das pesadas roupas invernais? Doce fantasia, que encanta crianças e também agrada a adultos!
Natal tornou-se a festa de Papai Noel. E o Menino Jesus, onde ficou? Não era dele a festa? Será que o “bom velhinho” – Hô! Hô! Hô! -, na sua pachorra, vai conseguindo o que Herodes não conseguiu com sua ira: eliminar o menino da cena? Presépio? Em seu lugar, uma árvore enfeitada de desejos coloridos. Duendes e bruxas em lugar do menininho de braços estendidos. Bichinhos da Disney em lugar dos pastores de Belém e suas ovelhas. E uma infinidade de pacotes e de doces, em vez do ouro, incenso e mirra, oferecidos pelos reis magos ao Menino Jesus!
Pois é… Quase tudo como no começo!
Quando Maria estava para dar à luz, José, muito aflito, batia de porta em porta e procurava um lugar em Belém para que o Filho de Deus pudesse nascer entre os homens. São Lucas informa apenas: “Não havia lugar para eles”. Por isso Jesus veio ao mundo num abrigo para animais, fora da cidade. Na cidade não havia lugar para ele. E, no entanto, continua atual o anúncio do anjo aos pastores nos campos gelados de Belém: “Não tenhais medo! Eis que vos anuncio uma boa notícia, e será boa também para todo o povo! Hoje nasceu para vós um salvador, que é o Cristo, Senhor!”.
Mais atual do que nunca!
Dom Odilo Pedro Scherer
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O religioso lembra a origem do Papai Noel ligada a figura de São Nicolau, mas o blog Blogadilla.com no post Santa Claus and his evil servant cita as figuras pagãs da mitologia nórdica como o deus Odin, o ogro Tomte ou Nisse, Papai Natal, etc. O blog cita o ajudante malvado do Papai Noel, duendes e criaturas como a cabra Yule, o demônio Krampus e Black Peter (Preto Pedro) que acompanhavam Santa Claus (São Nicolau) no Natal.
Completando o cenário a figura que hoje invade e sufoca o menino Jesus e a origem cristã da celebração de 25 de dezembro é atribuída aos desenhos de Haddom Sundblom nos cartazes e anúncios publicidade da Coca-Cola veiculados a partir dos anos 30 do século XX, como explica e ilustra o blog de Liliane Ferrari: A transformação do Papai Noel (post de 24/12/2010).
Uma festividade cristã transformada em uma orgia de consumo, luzes piscando e desfile de duendes e santos sem hierarquia, um típico festival de solstício de inverno, a ponto de exigir um chamado e alerta das autoridades católicas, pode ser interpretada como um sinal do fim do mundo e do apocalipse.
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